quarta-feira, 20 de junho de 2012

Até para o ano, Primavera!




Maneira de Amar


"O jardineiro conversava com as flores e elas habituaram-se ao diálogo. Passava as manhãs contando coisas a uma cravina ou escutando o que lhe confiava um gerânio. O girassol não ia muito com a sua cara, ou porque não era um homem bonito, ou porque os girassóis são orgulhosos por natureza.
Em vão o jardineiro tentava captar-lhe as graças, pois o girassol chegava a voltar-se contra a luz para não ver o rosto que lhe sorria. Era uma situação bastante embaraçosa, que as outras flores não comentavam. Nunca, entretanto, o jardineiro deixou de regar o pé do girassol e de renovar-lhe a terra, na devida ocasião.O dono do jardim achou que o seu empregado perdia muito tempo parado diante dos canteiros, aparentemente não fazendo coisa alguma. E mandou-o embora depois de assinar a carteira de trabalho. Depois de o jardineiro sair, as flores ficaram tristes e censuravam-se porque não tinham induzido o girassol a mudar de atitude. A mais triste de todas era o girassol, que não se conformava com a ausência do homem. "TRATAVA-LO MAL, AGORA ESTÁS ARREPENDIDO?" "NÃO, RESPONDEU, ESTOU TRISTE PORQUE AGORA NÃO POSSO TRATÁ-LO MAL. É A MINHA MANEIRA DE AMAR, ELE SABIA DISSO, E GOSTAVA"."Carlos Drummond de Andrade
"Quem deseja possuir uma flor, irá vê-la murchar. 
Mas quem olhar uma flor no campo, terá esta beleza para sempre."
        Paulo Coelho


                               "Faça os seus dias valerem as lembranças"
                                        Bill Milton

terça-feira, 5 de junho de 2012

O Cais do Sodré











Cais do Sodré, zona de transição entre o moderno e o antigo.
Na mesma zona, que agora até está na moda, há modernas ciclovias, esplanadas junto ao Tejo, autocarros turísticos de dois andares e bancos confortáveis e coloridos.
Os velhos e desempregados aproveitam esses bancos para trocarem conversas e irem deixando os pensamentos desvanecerem-se na ondulação do Tejo, que leva a vista para a outra margem.
Na mesma curiosa zona convivem bares nocturnos da moda e prostitutas, ciclistas de fim-de-semana e desempregados. Vagueantes, pedintes , bêbedos e pessoas que gozam o sol na esplanada.
As conversas perdem-se junto ao rio... As horas passam e os assuntos trocados não ficam mais interessantes. Conversas sem propósito fazem os dias de quem por aqui vai ficando. Quem está de passagem, sorri. Observa a paisagem e segue.
Se se quer estar com Lisboa, sentir o Tejo nos salpicos da passagem dos cacilheiros, ouvir as gaivotas rabugentas, e os velhos do Restelo esquecidos e à margem... O Cais do Sodré é o local.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Cabo Verde




























Cabo Verde, terra do calor e dos sorrisos. Do leve, levezinho, devagar, devagarinho quase parado. Terra do "no stress". O calor não o permite! São 11h e está um calor que nem me atrevo a ir para o sol; nem o quero tocar. Não me apetece fazer nada enquanto a água se evapora pelos poros e escorre pelas costas. O corpo não responde ao que a cabeça pensa. Estou habituada a férias em movimento e por isso a minha cabeça por vezes hesita. Mas o corpo só quer estar fresco e deitado. E que bem que sabe! Adormecer na varanda com um calor bestial à meia-noite e o céu a cobrir-se de relâmpagos. Sem barulho. Sem chuva. Tudo seco. Dizem que aqui só chove quando o Benfica ganha. 
Os cabo-verdianos são pessoas muito bem dispostas e brincalhonas. Farto-me de rir com eles. E é por isso que a minha cabeça se prende entre o sossego do hotel, o azul fresco da piscina e as voltas pela cidade para observar o movimento e conhecer as gentes. 
Sinto-me bem aqui, neste hotel tranquilo, sem demasiada gente e de índole familiar. A piscina tem sempre pouca gente e a música é suave. Quando chegámos no novo jipe da Toyota Prado foi um encanto para os empregados: "Vieram no Prado?" "Txiii!" - diziam contentes. E aquilo fazia sorrir pela simplicidade. Como crianças que se deslumbram com as pequenas coisas. Que bom! 
Como dizia, a minha cabeça relembra férias sossegadas no Vimeiro onde os dias eram quase sempre passados na residencial, onde lia e escrevia, brincava, e por vezes dávamos passeios pelas redondezas. Todas as manhãs ia a pé à vila buscar o jornal. Conversava-se entre canaviais e macieiras, junto ao riacho que alimentava as plantações. Aqui em Cabo Verde, o tempo passa devagar, o calor escorrega-nos pelos poros, e tudo se faz com calma. Deixa-se para amanhã o que se pode fazer hoje, mas mesmo assim, o dia ainda permite fazer imenso. Os pardais refrescam-se à beira da piscina, os trabalhadores dormem às sombras dos prédios, e alguns exercitam-se, correndo à beira-mar. Ao fim do dia as crianças riem alto enquanto brincam nas ondas junto ao pontão. E os pescadores amanham o peixe enquanto que os vendedores, com as suas tendas no pontão, trabalham a pedra e a madeira, alternando o seu trabalho com o descanso à sombra do muro. Enquanto isso, vão espreitando o jogo da bola que ocorre entre as balizas montadas na areia. As cores das camisolas ressaltam na areia branca e jogam com o azul cristalino do mar. 
Senegaleses e outros vendedores cabo-verdeanos mais escuros tentam angariar turistas para as suas lojas. Isto é o mais aborrecido: um simples passeio descontraído pode deixar de o ser pela extrema insistência dos vendedores para comprarmos as suas coisas porque dizem precisar de dinheiro para comer. Neste encontros aproveito para saber mais deles, e perceber porque estão ali, e como é o nível de vida que levam. Acabo por compreender que estão ali à procura do turismo que lhes dá dinheiro para enviarem para casa. Alguns sonham regressar às famílias. Dizem que a situação no país deles já está a melhorar. Cabo Verde é, mesmo assim, muito pobre e a felicidade deles é o futebol. Todos falam do Benfica, Porto e Sporting. 
No Sal, os souvenirs não são baratos, os preços também não. Dizem-me que ali a vida é cara por causa dos turistas. Outras ilhas menos procuradas conseguem resistir ao aumento de preços, mas a oferta de possibilidades de trabalho também é inferior. Sal é turístico e os preços não mudam para turistas e locais. Só as lojas de chineses trazem preços baratos. Os Cabo-verdeanos sabem que é o turismo que beneficia a ilha. Ilha essa que é a mais plana do arquipélago. Seca e plana. Com estradas pobres e de terra, e muito poucas povoações. As casas são de cimento e betão inacabadas. Em muitos locais a água não é canalizada, há poucos carros e poucas estradas asfaltadas. Os animais vivem pobremente e em Terra Boa, o deserto deles que curiosamente é a zona mais fértil, mas apenas quando chove, vivem agricultores cujo sustento são os animais que maltratam. A terra é seca e escura, onde se conseguem ter miragens quando o calor aperta demais. 
Cabo Verde é terra de sorrisos, mas de crianças que pedem timidamente uma moeda. Terra de Funaná e dança do roça-roça. Terra do descanso. Na praça de Santa Maria, o povoado a Sul da ilha, os locais sentam-se a conversar e passam nas suas t-shirts do Benfica e do Porto. As crianças brincam livremente, pulam, riem alto. No fim bebem refrigerantes pela palhinha felizes. Cabo Verde deixa saudades pela tranquilidade a que me habituo depressa. Bebo um ponche no restaurante Funaná e observo com calma quem passa e o que me rodeia. Vejo grupos de estrangeiros alemães, alguns portugueses que voltam sozinhos às ilhas e pagam cervejas às cabo-verdeanas enquanto lhes contam os planos para regressar, desta vez a Santiago, ou Boavista! Ilhas próximas e tão diferentes fisicamente. Diversidade boa que é notada, também, nas pessoas que ora são escuras, ora têm o cabelo queimado do sol, pele mais clara e olhos verdes. Os cabo-verdeanos, no Sal, são cuidados com o físico, passeando-se em tronco nú ou de t-shirts justas exibindo corpos esculturais. 
Vai deixar saudades esta tranquilidade, o mar quente e transparente e as praias longas onde não se vê vivalma. Deixam saudades os sorrisos calorosos, a ingenuidade, a experiência de mergulho, os banhos no lago salgado das salinas de Pedra Lume, qual Mar Morto, nunca se vai ai fundo! Terra promissora, em ascenção, onde há muito a ser feito. Eles dizem esperar que os turistas queiram investir. Crescem aldeamentos, vendem-se apartamentos, constroem-se resorts. Já há muitos que por ali ficam. Italianos que apostam na construção e em restaurantes com a sua comida. É só querer, é só termos vontade e ideias. Podia habituar-me a isto.